um pedido nada usual (excerto)

A fachada da companhia de multi-serviços 1.2rc2 é uma autêntica manta de retalhos. Reflexo da sobrevivência a três 1/2 terramotos, a dois tufões, a um ataque de harpias e, talvez a pior ocorrência, ter sido vítima inocente, na esquina octogonal lateral direita, logo a seguir à actualização 1.b, da mordida de Cerberus. Será, certamente devido a esses ataques, o motivo para a fachada não ter uma versão definitiva e actualizada.

É um edifício que aparenta estar a cair a qualquer momento, mas que é mais seguro do que um pudim molotov. E não deixa ser uma sublime visão arquitectónica para uns, ou uma aberração assustadora para outros. Acrescente-se o facto de ter, pelo que é dado a conhecer, duas portas de entrada e uma delas, introduzida na actualização rc1.b, estar colocada a trinta e cinco metros do chão. Podem dizer que a porta superior é apenas de saída, mas todos nós sabemos que primeiro as portas servem para entrar e só depois para sair.

Foi, pois, através da porta do rés-do-chão, na sua versão v1.0, que um homem de idade indecifrável entrou no edifício e se dirigiu com passo determinado ao balcão F1.
‘Quero encomendar um suicídio.’


informações: apenas um extracto da história

os amantes (excerto)

Ele sai de casa atrelado à sua yorkshiree terrier. Ela sai de casa a reboque do seu husky siberiano. Não se cruzam, mas encontram-se diariamente pelas 07h15m de relógio no sector 1.2rc2 do parque da cidade de Barcelos. Aí aguardam pacientemente que os canídeos defequem. Depois cada um deles com a mão direita envolta num saco de plástico recolhe da fina relva as fezes desiguais.

Mão extraída do saco; fechado com nó – ele e ela finalmente cruzam-se com um olhar tímido, cúmplice enquanto cada saco de fezes é depositado no caixote do lixo em sincronia.


informações: apenas um extracto da história

previsão de tempestade

Ouvi assim de raspão que estava previsto a partir das 02h00 da manhã de hoje um temporal em Portugal e que deviam ser tomadas medidas de segurança extras.

Posso confirmar esta previsão. Na minha cama perto das 03h15 começou um violento tufão com uma garina, mas não me importei de estar dentro daquele quente turbilhão que me foi oferecido a preço de ouro. A única coisa que ficou em pé depois da tempestade foi o meu coiso ofegante.

Com um banho quente relaxei e dormi com um anjo. Vivam as previsões!


o vosso meteorológico BigPole

um problema químico…

Para mim ter uma relação sexual é tão normal como roer a unha do dedo grande do meu pé esquerdo ou, numa imagem mais inocente, como pescar moncos dentro do nariz. Entendo, que pessoal, que só “faça o amor” a cada 29 de Fevereiro se sinta revoltado com a minha desenvoltura – temos pena!

Contudo, hoje, não falarei de sexo, mas de química, para perceberam que BigPole é um poço de sabedoria e para abafar, igualmente, os críticos mentecaptos.
Irão concluir, não apenas que a química está presente em muitos actos da nossa vida, mesmo naqueles que pensamos que não, mas também que eu subjugo não apenas o sexo como a química. Um pouco de arrogância nunca me fez qualquer mal.
Acho que será a primeira vez que vai ser tratado, de forma consensual porque quimicamente, o resultado de uma actividade realizada por qualquer ser humano desde sempre. Tentarei usar uma linguagem simples, singela. Aqui vai…

Ontem, ou se preferirem hoje de madrugada, eram cerca das 03h15m, num ambiente de néon proveniente da minha sanita, quando estava a descer uma calça Denim Fit Loose e uma cueca boxer Hom, com um adorável desenho de fantasia e, cuja textura ultra-leve aconchega na perfeição o meu orgão genital, para alapar as nádegas numa Kohler com assento aquecido, pensava no tempo que se perde a evacuar; daí que tenha sempre à mão algumas revistas para folhear.

Depois de terminar o meu serviço, já com o regueiro limpo e não uso papel higiénico, mas sim as opções de uma sanita 4-1 que tem, também, função de bidé e como tal recebo no sítio adequado um jacto de água oscilante a uma temperatura suave e um fluxo de ar quente para secagem, tudo ajustável por comando, ah! e tem controlo de odor, puxei o autoclismo, atirei a roupa para o cesto de roupa suja, e nu preparava-me para um rápido banho de imersão ao som de uma relaxante música ambiente, quando reparei que ficou a boiar no fundo da sanita um resto, razoavelmente redondo, de fezes. Assustei-me. Enojei-me ver aquela coisa a enfrentar-me do fundo da minha Numi. Decidido a acabar com isso usei a função flush-full. O impossível aconteceu e o naco de fezes ganhou ao turbilhão aquático e lá permaneceu a boiar plácido. Assustado duplamente fiquei. Aquilo não se misturava.

Humm….. estaria perante um problema de polaridade? Duplo hummm… hummm…
Vejamos: bebi umas boas cervejas, acompanhadas por um petisco capaz de fazer corar o colesterol. E como sabemos que a água é uma substância polar e as gorduras apolares estaria perante um pedaço de fezes hidrofóbico? Grande questão química percebem? Novo flush-full, o mesmo resultado. Conclui que tinha de anular de alguma forma a polaridade das fezes e como tal atirei para dentro da sanita uns guardanapos que fui buscar à cozinha. Desta vez experimentei um eco-full e pumba o poio desapareceu nos meandros do esgoto. Milagre químico.

Conclusões a tirar? Primeiro que foi mais fácil afundar o Titanic; segundo que tenho de cortar nas gorduras.


o vosso químico BigPole

será que se…

Se tivesse sido merda de pomba a cair na cabeça de Newton e não uma maça ele teria descoberto a lei da gravidade?


do vosso bom falante BigPole

o raio dos maios

A minha apavorante vizinha do décimo quarto andar não se cansa de depositar surpresas encostadas à porta blindada de entrada para o meu apartamento. São donuts, pães árabes, pães ázimos, pães franceses, pães integrais, decorados ora com uma vela, um palito colorido, um stick luminoso, pêssegos paraguaios, marmelos, mas também deixa artigos não comestíveis, como um fálico candeeiro lâmpada de lava vermelha, um broche em prata e outras coisas de que já não tenho memória. Não sei o que se passa naquela cabeça. Não consigo compreender, e tenho dois dedos de testa, o que ela quer conseguir com aquelas oferendas.

Já lhe disse com a menor simpatia que tenho que deve mudar de atitude, que é uma exagerada, que o que faz não tem qualquer sentido, que se deseja ter sexo comigo isso nunca vai acontecer, não porque seja feia (também não é bonita, até tem um corpo de pedir por mais), apenas odeio saber que tenho uma amante no prédio onde habito obcecadamente possessiva.

– A sua sorte é eu ainda ser boa pessoa e isto ser saboroso – respondi-lhe, na sexta-feira passada, após dar uma última trincadela na oblação, um donut caramelizado. Viro-lhe as costas e subo em passo de corrida pelo elevador até ao meu reduto.

Passados que foram dois dias do último donut olho para o espanto dos espantos; completamente apalermado fiquei a encarar um pito amarelo, de laço vermelho ao pescoço, num cesto de vime repleto de ovos de chocolate. Pego no cartão preso à asa e leio “Big, ofereço-lhe esse inocente pito como prova do meu apreço. A sua vizinha 14C“. Aquela prenda tinha a mensagem mais clara de todas. Senti que tinha de terminar com os abusos. As dádivas atingiram outro patamar pela ausência de subtileza; de inocente não tinha nada e o pito, ou mais correctamente o frango, da oferecida, que deve ser tudo menos cândido, foi-me oferecido em vermelho.

Mal sabia que o pior estava para vir. Hoje, 30 de Abril, lá descobri refastelado no chão um cesto de verga castanho com imensas maias ou maios, enfim ramos de giestas amarelas. Fiquei assustado. Odeio rituais, até os pagãos. Iniciei um laborioso processo mental, só como eu sou capaz, e concluí que o ritual tem como objectivo último impedir a entrada do Burro, do Maio ou do Carrapato nas casas; afastar as entidades maléficas, os demónios. Chegado a esta ilação uma paz interior colou-se ao corpo. Finalmente a 14C ia deixar-me em paz. Coloco os maios e desvio a vizinha carrapata da minha porta – pensei. Grande burra acabou de dar um tiro no pé; deu, mas foi, um tiro nos dois pés e caiu de frente. O susto já era uma miragem e comecei a gargalhar todo satisfeito quando o tiimmm do elevador antecipando a abertura das portas interrompeu a quarta risada e vi lá dentro a 14C vestida de branco, coroada com flores, descalça, diáfana, a exalar fertilidade. As portas fecharam-se e o elevador desceu. Se eu fosse o Reed Richards os queixos tinham-me caído literalmente ao chão.

Que se fodessem os maios, que não eram precisos. O diabo já estava dentro de casa, dentro de mim. E o demónio em mim entrou em parafuso. Tresloucado desci, imagine-se, pelas escadas, abalroei a porta do 14C para a encontrar sentada, sensual, num trono de flores. Lancei-me a ela de arpão em riste, rasguei-lhe a parca cobertura; de costas para mim e com as mãos apoiadas nos braços da poltrona florida enfiei numa líquida vulva um sequioso pénis com tanta facilidade que quase perdi o equilíbrio não me tivesse agarrado a dois seios tesos, ausentes de artificialismos. Com a coluna a arquear a cada investida minha senti que estava a gostar da viagem de tobogã; e quando comecei a despejar 117 milhões de demónios, contagem do meu último espermograma, ri-me em deliciosos sobressaltos da imagem mental que me surgiu, assim do nada: um pito amarelo, de laço vermelho a afogar-se num taça cheia de manteiga.

Abandonei-a sufocada por suspiros, sabendo que os meus demónios irão morrer pacificamente em suave agonia em 24 horas – maios para quê.

Finalmente exorcizei-a.

o vosso exorcista: BigPole

recordações

  • Há casais que guardam na caixinha das recordações o primeiro dente de leite que caiu do amoroso filho.
  • Há casais que conservam na caixinha das recordações o primeiro caracol loiro, preto, castanho, ruivo do filho desbastado pela tesoura do cabeleireiro.
  • Há pais que colaram na parede o primeiro postal do Dia do Pai criado na pré-escola.
  • Há mães que têm na gaveta dos soutiens e dentro de uma caixinha de cartão, que já teve um relógio gravado com os dizeres “amo-te para todo e sempre” do marido traidor, com publicidade da ourivesaria da esquina, o primeiro pedaço de barro esculpido na pré-escola comemorativo do Dia da Mãe.
  • Há madrinhas que mantêm encerrada na caixa original a vela do baptismo do afilhado.
  • Há ex-noivas, agora viúvas, casadas, divorciadas, amantizadas que mantêm pendurado no guarda-fatos o vestido de noiva.

Eu, o vosso poderoso, BigPole, guarda emoldurado numa linda caixa hermética o primeiro preservativo usado numa verdadeira luta sexual, que encerra dentro o esperma expulso e colados dois pêlos pubianos ruivos da minha amante, actualmente sem rosto.

do vosso coleccionador: BigPole

vazio? eis a questão!

Entrei na Trindade com destino a Vila de Conde. O metro quando chegou à estação da Fonte de Cuco estava completamente cheio; transpirava pessoas por tudo o que era sítio.

Corria tudo bem, estava a curtir uma boa leitura e uma doce música, até entrar um velhote na estação de Esposade que petrificou o olhos em cima de mim; o olhar suplicava o meu lugar. Que cena! Dirigi a vista para os lados e não pude deixar de constatar que estavam no compartimento pessoas mais novas do que eu. Que fossem elas a ceder o lugar. Hoje em dia há cada marado.

Mais um solavanco e foi com dificuldade que o velhote se aguentou a pé, apesar de estar abraçado a um varão. Vi-lhe gotas de suor a escorrer pela cara; só faltava o sujeito ter agora um ataque de coração. A agravar o clima os olhos do homem continuavam acampados em mim. Haja paciência! O tipo não vê que a carruagem está repleta de adolescentes bexigosos. Porque não os encara ao estilo Bambi?

Fiquei tentado a levantar-me quando percebi que o velhote até podia ser o meu pai. Se, assim fosse, eu gostaria que alguém lhe tivesse cedido o lugar. Cruzei e descruzei as pernas com a ideia de que, possivelmente, mesmo que remotamente, poderia estar a ser um sacana – ele podia ser o meu pai!

Ele podia ser o meu…, no segundo momento em que este pensamento me ocorreu tive a epifania que resolveu os problemas morais que estava a sentir; a constatação de que em situação semelhante, o mais certo, era o meu pai não ter alguém a ceder-lhe o lugar porque existirá sempre um filho-da-puta como eu. Fiquei com o espírito sossegado, encerrei as pálpebras para apreciar devidamente a Icarus Dream Suite Op. 4 de Yngwie Malmsteen que começou a invadir-me os ouvidos.

perguntas e mais perguntas

Exemplo de como responder com perguntas ou irritar exponencialmente uma pessoa.
Esta conversa aconteceu hoje de manhã entre a minha modesta pessoa e um palerma metido à burro.

— Estás chateado comigo Big?
— Fizeste ou disseste alguma coisa que me faça estar chateado contigo?
— Que eu saiba não.
— Então porque haveria de estar chateado contigo?
— Por nada. Foda-se que tu às vezes és parvo. Só complicas.
— Já reparas-te que agora é que tenho motivos para estar aborrecido contigo?
— Vai mas é à merda.
— À merda vou, mas só se te for ao cu. Posso?

A dita pessoa virou-me as costas e eu ganhei o dia.

Mais uma lição

do vosso bom falante: BigPole

lapdance 1.01

Num abrir e fechar de olhos LapDance chegou ao destino. Claro que para quem tem dois dedos de testa, enfim, para qualquer entendedor mediamente inteligente LapDance nunca fechou os olhos; isso seria o convite ao suicídio. É um sujeito doido, até desleixado, mas não kamikaze. O que interessa para a nossa história é o facto de que viajou mais rápido do que uma lesma vítima inocente da toma de viagra.

Desligou a mota no parque reservado aos VIP. Levantou a viseira do capacete, adorava especialmente este momento mágico; enquanto posicionava o descanso admirou-se com os pneus esfarelados, sintoma de boas curvas e ardente velocidade; o crepitar do escape abriu-lhe o apetite para umas castanhas assadas na brasa. Ali de preto iluminado apenas pela luz do candeeiro público auto alimentado sentiu-se um homem capaz de enfrentar sem dificuldade qualquer problema que Nectarina tivesse ou viesse a ter.

Só depois deste inócuo narcisismo é que tirou o capacete, deixando-o a repousar no depósito de gasolina, e observou pasmado e com uma total incompreensão a Bolo-Rei. Olhava como uma vaca para o vazio deixado por um TGV que ora estava ali, ora já não. Os seus olhos presenciavam a ausência de luz onde esta deveria existir. Se estivesse com o capacete alojado na cabeça poderia usar como desculpa a massa anónima de insectos colados à viseira. A verdade é que os enormes tubos de néon que compunham em voltas e reviravoltas as letras da palavra Bolo-Rei estavam completamente às escuras – seria agradável um suave piscar, até uma faísca. O facto da Bolo-Rei ter a forma de um rectângulo de ouro não sossegava LapDance; e a agravar o quadro nem a luz piloto, amarela, que assinalava a campainha das traseiras emitia qualquer luminosidade. Estranho, muito estranho, pensou. Estaria a sonhar? Um calafrio seria algo que não desgostaria LapDance; sempre era a prova de que estava bem acordado, mas o seu fato Alpinestars entre outras funcionalidades mantinha-o a uma temperatura corporal constante.

Cautelosamente aproximou-se da porta. As botas faziam estalar a gravilha; o tubo de escape copiava o som. Sentiu que estaria melhor no sofá a curtir um filme e a comer pipocas. A sua tara por comida era lendária, e qualquer motivo servia de pretexto para provocar todas as suas papilas gustativas.

Empurrou a porta que estava ligeiramente entreaberta. Entrou, e o que sentiu de imediato foi um cheiro que lhe trouxe agradáveis recordações de orgias, o cheiro adocicado de vómito; mas por mais preparado que pudesse estar não estava para aquele cenário.

[em continuação…]