barbaridade

Entrei no apartamento. Sentia-se a atmosfera pesada, como se o local soubesse que ali tinha sido cometido um crime.

Antes de entrar no quatro já se ouvia a azáfama da equipa forense. Apesar de ter visitado muitos cenários de crimes hediondos nunca deixo de ficar chocado com a capacidade humana para a crueldade. O que deparava perante os meus pés era o crime dos crimes. Uma bíblia foi desventrada por um punhal. Deu para perceber que proporcionou luta: diversas páginas estavam rasgadas, ainda coladas ao miolo, outras páginas encontravam-se espalhadas pelo chão – barbaridade.

an impulse

Following an impulse, I define myself, from now on – God ex-machina -, as a plastic puff artist or a monazitic artist. I put a monazitic sand cone in any place (always 1 kg) and with a blue cocktail straw, also known as a tube to sip liquids, of 10cm long, I puff.

With the sobbing velocity of the air expelled through the plastic tube I get traits in the sand of varied aspect. When I feel that “I am there and here”, “this is what I want” I obtain a new work of art.

My public is the one who loves the Ephemeral Art but that feels it has been offered a punch in the solar plexus; the emotions it arises are plenty … my art.

I don’t set any photo because I refuse myself to perpetuate works of art that must be savoured on the spot.

contagens

Subi as escadas de mármore castanho. Contei dez degraus até ao primeiro patamar. Virei à esquerda e contei onze degraus. Novo patamar. Parei perante a incoerência da contagem. Desci até ao rés-do-chão para recomeçar a contagem e aí chegado insultei-me por não ter iniciado a contagem ao descer. Desta feita contei onze degraus – aqui estava a explicação. Reiniciei a subida lamentando o erro da primeira contagem e um arrepio desceu pela coluna. Estremeci. A contagem até ao segundo patamar foi de dez degraus. Senti um sufoco. Tonturas. As paredes começaram a abafar-me. Colei-me à parede atordoado. Confuso tentei convencer-me de que a minha obsessão pelo equilíbrio e coerência estava a transformar-se num problema. Desci acelerado os dois patamares. Respirei fundo. Reiniciei a subida. Dez degraus, esquerda, dez degraus. A harmonia desceu sobre mim. Sorridente iniciei a escalada de um novo patamar: contagem dez degraus – tudo certo. Nova viragem à esquerda e onze degraus. Como? Como? Limpei as gotas de suor que escorriam pela testa. Desci os patamares tentando não pensar muito no assunto. Entrei no elevador e carreguei no botão para o segundo andar. A porta fechou-se e a subida iniciou-se suavemente. O elevador parou com um ligeiro solavanco. A porta abriu-se e perante mim exibiu-se em plena claridade o rés-do-chão.

dialogues – did you eat chocolate?

— Did you eat chocolate?
— How do you know?
— Your breath smells like chocolate.
— Oh! Yes, I did.
— You were not even able to deny it.
— Do you want me to be a liar? You’re the one who buys the chocolate. You’re luring me.
— Yes, It’s true that I buy the chocolate, but I’m thin. And besides, it was hidden.
— Hidden? What a great hiding place, in front of the crackers. Conclusion, I am fat and greedy. And the fact that you’re thin gives you the right to eat the chocolate by yourself? And all this revolt because of 100 grams of chocolate – you insult me.
— Insults? Are not you fat?
— Of course I’m not fat, I’m overweight.
— That’s right … and you were not greedy about eating aaaaall the chocolate?
— Of course not, I was an opportunist. Opportunity makes a glutton.
— You’re right, you’re not fat or greedy… you’re a dick. Jeez!
— I do not say no to that. When are you going to buy and hide more chocolate?
— Turn off the light and sleep.

sal-gema

O que tive fazer para ajudar…

Fui à praia para encontrar
uma rocha especial,
com sabor a sal.

Descobri muitas rochas.
Umas em forma de ovelhas,
outras em forma de borrachas.
Umas eram velhas.
Outras pareciam novas:
polidas e brilhantes,
muito elegantes.

Fiquei com pena
por não encontrar
uma rocha sal-gema.


mas não era isto que se desejava… nova tentativa:

O sal-gema é uma rocha
especial
com sabor a sal.


Forma-se pela evaporação
das águas marinhas.
E a isto chama-se precipitação.


É uma rocha sedimentar
com aplicação alimentar
que fui encontrar na cozinha
a temperar a sardinha!

i don’t love that he gets in me

I don’t love that he gets in me;
I don’t love that he strolls in me;
I don’t love that he has fun in me;
Him? He loves to get in and out of me:
without remorse, without morality.
But today I decided to take back the possession of the key for me:
I killed him.
And, now, I love to be eating him piece by piece into me.

são meus

Sinto falta dos meus mortos vivos. As suas inexistências impedem o meu viver. Será que me visto de preto cinzento porque percorro os meus caminhos em perpétuo luto? Talvez não. A verdade, contudo, é que sei claramente que subsisto com uma alma outonal.

Ah! O quanto odeio o Outono. Estação de queda; na qual terminam todos os ciclos.

lol – mexicano

Mais uma versão do LOL – mexicana.

lol – camões

Uma imagem do LOL – adulterada!

haverá

Haverá algo melhor do que sentir a chuva a cair no guarda-chuva ao som da Lacrimosa de Mozart, debitada directamente nos ouvidos, enquanto o cheiro da terra molhada te impregna o nariz, a humidade e o frio te rodeia e embala, além de estar sentado na cama, quente, aconchegado pelos lençóis e pelo corpo sensual que se entrelaçou no teu, enquanto sorves um golo de chá quente e te preparas para iniciar a leitura do Romance de Genji e vês no parapeito o gato a brincar com a chuva que bate hipnoticamente nos vidros da janela?