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apropriação

São as cores, os fazeres, os dizeres – tanta confusão, tanta discussão.

Certo dia, certa conversa mais ou menos assim, quando se fez perguntas sobre a raça.

Respondi que sou de uma raça filha-da-puta, mesmo filha-da-puta!

‘Que merda de resposta é essa?’

‘Há dias que me sinto vermelho por dentro e verde por fora. Nesses dias sou da raça melancia’ – continuei. ‘O pior é quando me sei amarelo por dentro e branco por fora. Podia-se pensar que seria da raça ovo, mas a verdade é que não me vejo a sair pelo cu de uma galinha.’

lol, camuflagem 10.0 – desvio

Apesar de ter criado uma história. Não a publico. Fica apenas a imagem de um lol tirolês.

lol, camouflage 6.1 – by books

lol in typical Next Thursday fashion has navigated through books never before navigated. He has left the three-dimensional space and entered the multidimensional space. He is looking for the perfect book for his hideaway. So, he jumps from book to book like a grasshopper – free of responsibilities, of deadlines to meet. His current motto could almost be “Pack your knapsack and go.” After so much jumping and running through amazing, minimalist and tragic books, of dense, light and dour writing, he opts, for his lair, for an illustrated book filled with people sitting on roofs, peering from windows and doors, descending and ascending stairs, dressed in blue, green, brown, yellow or striped, traveling on a train, ship or submarine; with strange and normal objects; with real bears and teddy bears; with fish and dinosaurs, horses, cows and even robots. In that crowd, that mosaic of confusion, lol realizes, finally, that he will be camouflaged. Then we hear him say ‘let me through’ while bypassing a green tank driven by a yellow fish; ‘do not push’ as he crosses paths with a blue group of soldiers; ‘do not fall’ as he faces Humpty Dumpty, who is on top of a wall made of books. Then we see him getting more than annoyed when he observes that the house made of cards is occupied by an astronaut, a skier, a conductor, a matrioska. lol throws his arms up high and grumbles loudly ‘SERIOUSLY! EVEN A MATRIOSKA?’

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haja ânimo

Todos os dias eles subiam a mesma escada; encontravam, logo no topo, assim de rajada, enclausurado na vitrina de sempre, o mesmo cartaz com os dizeres “Haja Ânimo”.

Todos os dias, que eram tudo menos santos dias, contavam mentalmente, com o coração cheio de desânimo, os degraus: e um, e dois, e três, e agora quatro, e cinco, e já está quase, e seis, e sete, e oito, e noveeeeee e raios partam tudo… ufa… dez. E logo no patamar o cartaz que já foi de um amarelo vivo, agora descolorado pela passagem dos anos, sorria desdenhosamente para eles a publicitar um já muito ultrapassado “curso prático contra o desânimo, o ruído, o medo e a solidão”. Sentiam, quando o deixavam para trás, o sorriso espetado nas costas – a gozar com eles.

Eles que já foram crianças cheias de sonhos, adolescentes com hormonas saltitantes, adultos com esperanças, velhos com saudades. Eles que passaram por todas as pungentes quatro fases de um ciclo de vida, mas ao contrário da borboleta a última fase não é de um lindo renascimento, vêm-se agora numa nova, assustadora e inesperada quinta fase: a fase zombie.

Eles de olhos mortiços, corpos amortalhados, de andar morrediço são os novos zombies; são a corporalização do desalento, do dilaceramento individual; são autómatos de carne e sangue que obedecem sem reflexão a vontades incoerentes. Eles sabem-se bobis que recebem diariamente um osso descarnado em troca do nada.

O que lhes resta? Certamente a revolta, porque a vida nunca são dois dias.